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19 set
Como a inovação desafia o direito tradicional

Com a avalanche de novas tecnologias, fintechs e startups em geral, é preciso olhar para o mercado e advogar de forma diferente e inovadora. O papel do advogado é defender a melhor medida, com uma participação que seja positiva e em prol do cenário disruptivo do empreendedorismo. Há uma necessidade de colocar-se no lugar dos empreendedores.

Pode parecer uma recomendação complexa para quem foi educado a enxergar o risco e a comparar a prática com a regra posta – sempre com o intuito de proteger seu cliente, diga-se. No entanto, quando o assunto é inovação, a defesa não representa uma prioridade e a regra não está definida: o empreendedor precisa criar um produto que resolva problemas de uma forma que ninguém imaginava ser possível e, consequentemente, de maneira que não se encontra escrita (regulada).

Seguindo por essa linha, então, parece equivocada a busca desenfreada por regulação daquilo que a “startup do dia” propõe, antes mesmo que tais inovações tenham obtido sucesso de público, estejam pacificadas como aplicação ou que interfiram, em maior grandeza, na rotina e na vida comum dos indivíduos.

Essa ânsia positivista parece crucificar toda tese que já não esteja aprovada pelo Congresso; como se fosse proibido inovar, como se o princípio da legalidade (“o que não está proibido, é permitido”) estivesse invertido.

Em um País em que a desigualdade social atrapalha o desenvolvimento, limitar a liberdade de iniciativa é o mesmo que garantir a concentração de poder na mão dos poucos e mesmos de sempre; e quanto menos concorrência, teremos menos espaço para trabalho e menos ofertas diferenciadas para os consumidores. A regulação, por um lado, permite maior segurança nas relações entre os privados, mas protege aqueles que já alcançaram seu espaço.

Vejamos o que ocorre com os chamados criptoativos (como representantes do Banco Central do Brasil tem se referido publicamente) – entre os quais o Bitcoin é o mais notório – e com o blockchain, onde os prováveis impactados (bancos e outras infraestruturas do mercado financeiro) retardam o desenvolvimento do mercado relacionado a tais tecnologias.

Temos acompanhado o movimento dos maiores bancos brasileiros ao cancelar as contas bancárias de corretoras de criptoativos. Todos sabemos que os canais bancários são um meio para desenvolvimento de qualquer atividade comercial e que, portanto, essa decisão das grandes instituições financeiras criam uma barreira para o setor. Um processo que está em votação na Corte brasileira, questiona justamente o possível abuso de direito dos bancos nesse caso.

Esses mesmos bancos tentaram realizar semelhante bloqueio no Chile, mas foram impedidos pelas autoridades locais, que defenderam a liberdade de iniciativa. Tal qual ocorreu no mercado de transporte de passageiros ou de reserva de apartamentos, quando essas mudanças ameaçam o domínio de quem se vê estabelecido, o grito é de que a inovação é ilegal, irregular. Este é o remédio chamado às pressas para curar a dor de saber-se ineficiente, ultrapassado.

Em especial, sobre os criptoativos, embora nenhuma lei defina a sua natureza jurídica, normas gerais permitem acolher tais ativos. Inclusive, esse é o entendimento da Receita Federal do Brasil, ao tratá-las como bens comuns, sujeitos à tributação de ganho de capital como qualquer outro de sua categoria. Diversos bens são negociados em estruturas semelhantes às das corretoras de criptoativos, e nem por isso, os bancos lhes negam, de forma organizada, acesso ao sistema bancário.

Nesse sentido, uma corretora que permite acesso a bitcoins, ether, ripple e outros ativos digitais pode (e deve) seguir as normas que são, também, obedecidas por bolsas de mercadorias físicas, como a Bolsa Brasileira de Mercadorias. Podem (e devem), inclusive, saber quem são seus clientes, realizar monitoramento de operações suspeitas e comunicar ao COAF casos em que percebam indícios de lavagem de dinheiro ou financiamento ao terrorismo.

A pretensão de muitos advogados que militam no mercado financeiro e de capitais em vê-las tratadas como ativo financeiro ou valor mobiliário deve ser mantida em debates conjuntos com as discussões globais sobre o tema, mas não podem servir de armadilha para que as empresas estabelecidas impeçam a inovação com subterfúgios regulatórios.

Nos Estados Unidos, por exemplo, temos visto o movimento mais favorável ao mercado, ainda que não haja estabilização sobre o tratamento a ser dado pelos reguladores locais. Neste sentido, recentemente, a ICE (operadora de 23 principais bolsas globais, incluindo a Bolsa de Valores de Nova York – NYSE), que já era investidora da Coinbase (maior corretora americana), divulgou que irá montar uma plataforma para desenvolver instrumentos de investimento em criptoativos (Bakkt).

Como em todos os setores da economia, regulado estritamente ou não, a negociação de desses ativos digitais pode atrair pessoas que façam mau uso do negócio. E, como em todos os demais setores, quem opera regularmente irá colaborar para que aquelas pessoas sejam punidas e excluídas do mercado.

Essa tecnologia não pode ser punida no lugar dos infratores, assim como o dinheiro não foi condenado por aparecer em malas, nem se tem notícia de avestruz aprisionado por pirâmides construídas em seu nome.


Por Reinaldo Rabelo de Morais Filho é diretor jurídico, de compliance e riscos do Mercado Bitcoin.
Fonte: Época Negócios

 

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