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18 jan
Assumindo crimes para salvar a empresa: lições de mediação para uma solução de conflitos a partir do filme “7 años”

Artigo escrito pelo professor da Escola de Direito Aplicado Leandro Lages

(Imagem: divulgação Netflix)

Você assumiria um crime, com prisão de 7 anos, a fim de proteger os seus sócios e salvar a empresa? Essa é a premissa do filme espanhol “7 años”, da plataforma Netflix.

O filme inicia com uma tensa reunião entre quatro sócios. Seus crimes fiscais foram descobertos e poderão ser presos, o que acarretará a falência da empresa.

O setor jurídico propõe uma solução: um deles assumir os crimes, permitindo que os demais sócios continuem à frente da empresa, evitando a falência. Ao final do período de prisão, o sócio retornaria à empresa. A questão é: quem assumirá o crime? Um mediador é contratado para auxilia-los na difícil escolha.

Logo no início, o mediador indaga se os sócios têm conhecimento da situação e das consequências para as suas vidas, se estão seguros para resolver via mediação. Todos concordam, o que representa o “princípio da autonomia da vontade na mediação”, no qual o consentimento deve ser genuíno e os participantes se tornam protagonistas de suas decisões e responsáveis por seus destinos.

 

Em seguida, são informados a respeito das seguintes regras básicas da mediação:

(1) permanecer de forma voluntária, quem se sentir incomodado poderá sair a qualquer momento, inclusive o próprio mediador;

(2) ser imprescindível escutar e se respeitar, as pessoas envolvidas não representam um problema, mas sim parte da solução;

(3) o mediador não se posiciona a favor de ninguém e nem julga, apenas facilita a comunicação na busca da solução mais confortável. Isso corresponde aos princípios da “imparcialidade na mediação” e da “busca do consenso”.

(Imagem: divulgação Netflix)

A explanação de todas essas regras corresponde ao “princípio da decisão informada”, segundo o qual as pessoas precisam compreender o funcionamento da mediação para assumirem decisões de forma segura e consciente.

A sessão prossegue com muito diálogo, mas sem registro em ata ou anotações em documento, o que representa o “princípio da oralidade”, essencial para que a mediação se desenvolva, possibilitando que a pessoa perceba ser destinatária de atenção quando escutada com respeito. Também uma evidência do “princípio da confidencialidade”, permitindo que todos se expressem livremente quanto a questões íntimas e informações sensíveis. Isso facilita a identificação dos interesses envolvidos, primordial para que uma negociação progrida.

A condução da mediação com a livre fala de todos e a análise de propostas lançadas reflete o “princípio da informalidade”. Uma informalidade no sentido de simplicidade, pois a mediação não possui regras fixas e rígidas, o que deixa as pessoas mais à vontade na negociação, favorecendo a comunicação.

Em um determinado momento do filme, alguém propõe a escolha por meio de sorteio. Um dos sócios recusa, argumentando que uma decisão de tamanha importância não pode ser decidida na sorte. O mediador esclarece que o sorteio, apesar de ser um método simples, não representa a melhor forma, sendo essencial compreender quais os interesses de cada sócio.

(Imagem: divulgação Netflix)

E todos têm algum interesse considerado essencial e que não admitem perder: um deles tem uma filha menor de idade, outro possui um pai com problemas de saúde, todos possuem família necessitando de alguma atenção. Nesse momento, o mediador esclarece que não se deve abordar o assunto sob a ótica da perda, pois há soluções em que todos ganham.

E ilustra com um caso em que duas pessoas disputavam uma laranja. Várias soluções foram apontadas, sem que chegassem a um consenso. Não foi possível, por exemplo, resolver por meio de sorteio e nem partindo a laranja ao meio, pois todos desejavam a laranja inteira. Também não chegaram a um consenso sobre o pagamento de um valor pela fruta. A solução foi alcançada quando ambos expuseram os motivos pelos quais desejavam a laranja. Um deles tinha interesse na casca para um produzir doce e o outro necessitava a polpa para suco. E assim foi possível utilizar a laranja de forma a atender a ambos.

Com esse exemplo, o mediador convenceu os sócios de que precisavam focar nos interesses da empresa, ocasião em que decidem escolher aquele que fosse mais “dispensável”, ou seja, o que fará menos falta à empresa durante os sete anos de prisão.

(Imagem: divulgação Netflix)

Cada um deverá expor os seus argumentos, para em seguida procederem a uma votação. Nesse momento o filme atinge o seu clímax, com debates e argumentos entre os sócios conduzidos com maestria pelo mediador.

Enfim, além da temática “Mediação”, o filme comporta discussões no campo do direito empresarial, compliance, ética e argumentação.

Ao analisar o filme sob a ótica da mediação, percebe-se a necessidade de reformular a pergunta do início desse texto. Ao invés de indagar se alguém assumiria um crime para proteger os sócios e salvar a empresa, um bom mediador indagaria: “que interesses devem ser considerados para que alguém assuma um crime no intuito de proteger os sócios e salvar a empresa?”

Uma simples mudança na perspectiva da indagação induz a um debate mais propositivo, com possibilidade de respostas que exprimam interesses válidos, alcançando uma solução em que todos ganhem.

Reunião do grupo de extensão “Direito, Cinema e Literatura” comandado pelo professor Leandro Lages

Assim deve agir um mediador, conciliando os “interesses” em conflito e não as “conveniências” das pessoas em litígio. Aliás, assim devemos agir na vida, identificando os nossos reais interesses sem desrespeitar ou comprometer os interesses alheios.

E você, já parou para refletir sobre os reais interesses em sua vida?

O filme foi debatido na disciplina “Conciliação, Mediação e Arbitragem” e no projeto de extensão “Direito, Cinema e Literatura”, do iCEV

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