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23 ago
Privacidade e Proteção de Dados do Usuário na Internet

Não é mistério a ninguém que esteja vivenciando o surgimento acelerado de novas tecnologias as mudanças que têm ocorrido nas relações sociais, cada vez mais virtualizadas. Novos bens jurídicos têm surgido e tudo está propenso a virar mercadoria, inclusive as próprias pessoas. Em um mundo cada vez mais influenciado por algoritmos, o dado pessoal é bem jurídico relevante e que tem valor econômico. Dados da pesquisa do usuário podem revelar, por exemplo, sua opinião política, suas convicções religiosas, suas preferências de consumo e detalhe de sua saúde.

 

“Dados monetizáveis, eis um elemento novo em um discussão antiga sobre o conceito e as funções de privacy, que não corresponde tão somente à “esfera mais nuclear da vida privada” (acepção franco-alemã) nem ao espaço das “relações íntimas entre as pessoas” ou o do right to be left alone (o direito de ser deixado em paz), as duas apresentadas como acepções norte-americanas. A nova privacy insere-se no acesso e no fluxo de dados pessoais, que se desdobra em: a) controle de acesso e uso dos dados que “constituem sua identidade pessoal e permitem o livre desenvolvimento de sua personalidade”; b) o conteúdo desses dados açambarca elementos como “opinião política, convicções religiosas, vida sexual, dados de saúde e dados genéticos”. O consentimento do acesso a dados pessoais, que é tratado de modo displicente pelos usuários da Internet, será colocado em outro patamar quando a IoT se difundir como padrão na indústria automobilística, de eletrônicos e eletrodomésticos”. – Otávio Luiz Rodrigues Jr em seu livro “Direito civil contemporâneo: Estatuto Epistemológico, Constituição e Direitos Fundamentais”.

 

Portanto, se uma empresa da internet comercializa dados de seus usuários sem o seu consentimento, ela está sujeita a punição no âmbito do direito do consumidor.

 

Multa milionária

No Brasil, a Secretaria Nacional do Consumidor aplicou em julho de 2014 uma multa de 3,5 milhões de reais à Oi S/A por ter sido constatado que ela monitorava a navegação de seus usuários na internet, para posterior comercialização de dados. Na Itália, a Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato aplicou em novembro de 2018 duas multas num total de 10 milhões de euros ao Facebook por não os informar de forma adequada e imediata, durante a fase de ativação da conta, da atividade de coleta com intuito comercial dos dados fornecidos por eles.

Nos Estados Unidos, a Federal Trade Commission aplicou em julho de 2019 ao Facebook multa de 5 bilhões de dólares por ter violado ordem da FTC de 2012 e enganado os usuários sobre sua capacidade de controlar a privacidade de suas informações pessoais. A ordem de 2012 proibia o Facebook de fazer declarações falsas sobre a privacidade das informações pessoais dos consumidores, bem como acerca do compartilhamento dessas informações. Contudo, restou comprovado que a empresa compartilhou os dados de usuários do Facebook com desenvolvedores de aplicativos de terceiros, mesmo quando esses usuários definiram configurações de privacidade mais restritivas.

 

Algoritmo que elegeu o presidente dos Estados Unidos

 A principal prova do compartilhamento indevido ocorreu quando Facebook permitiu que uma API (application programming interface) de terceiro, desenvolvida por Aleksandr Kogan, fosse disponibilizada na rede social para identificar o perfil psicológico dos usuários. Os 270 mil indivíduos que responderam o questionário foram informados que se tratava de um estudo acadêmico e foram compensados ​​por sua participação. Contudo, a referida API acessou não apenas o perfil desses indivíduos, mas os perfis de seus amigos do Facebook – até mesmo daqueles que haviam solicitado o máximo de privacidade. Dessa forma, a API coletou dados de 87 milhões de usuários.

O tratamento de dados pessoais gera informações inerentes à personalidade do usuário da internet

Posteriormente, a empresa Cambridge Analytica teve acesso a estes valiosos dados e desenvolveu algoritmo capaz de identificar traços de personalidade de eleitores norte-americanos e como influenciar seu comportamento. Após ter sido contratada pelo partido republicano, a empresa possibilitou o envio de propaganda eleitoral personalizada pelo Facebook.  Essa estratégia se mostrou eficiente pois, apesar da candidata democrata ter sido apontada como favorita na maioria das pesquisas de intenção de voto, o candidato republicano foi eleito presidente dos Estados Unidos de 2016 apenas no colégio eleitoral, isto é, apesar de ter perdido no voto popular geral.

É certo que a propaganda personalizada pode trazer danos ao usuário, como, por exemplo, o superendividamento. Contudo, a publicidade personalizada gerada a partir do monitoramento de dados pode influenciar o indivíduo até mesmo no seu voto, conforme demonstrado no caso envolvendo o Facebook e a Cambridge Analytica.

Esse caso é apenas um exemplo de uma infinidade de situações em que o indivíduo pode ser prejudicado quando seus dados são coletados e tratados. O tratamento de dados pessoais gera informações inerentes à personalidade do usuário da internet. Tais informações podem impor ao indivíduo limitações à utilização de serviços e, até mesmo, afetar o livre exercício de sua cidadania. Portanto, a proteção dos dados pessoais pode ser considerada um dos direitos da personalidade do indivíduo. Corrobora com este entendimento:

 

“A disciplina da proteção de dados pessoais emerge no âmbito da sociedade da informação, como uma possibilidade de tutelar a personalidade do indivíduo, contra os potenciais riscos a serem causados pelo tratamento de dados pessoais. A sua função não é a de proteger os dados per se, mas a pessoa que é titular desses dados.” –  Laura Schertel Mendes, em seu livro “Privacidade, proteção de dados e defesa do consumidor”.

 

Muito por conta disso, propõe a PEC 17/2019 – atualmente em trâmite na Câmara Federal, e já aprovada no Senado Federal – a inclusão da proteção de dados pessoais, incluindo os digitalizados, no rol dos direitos e garantias fundamentais protegidos pela Constituição da República de 1988.

 

 

e Daniel Teixeira Bezerra

 

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